19 de março de 2018
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ICosmetologia
O Sol é
essencial para a vida na Terra e seus efeitos sobre o homem dependem das
características individuais da pele exposta, intensidade, frequência e tempo de
exposição, fatores que, por sua vez, dependem da localização geográfica,
estação do ano, período do dia e condição climática. Esses efeitos traduzem-se
em benefícios ao ser humano, como sensação de bem-estar físico e mental,
estímulo à produção de melanina com consequente bronzeamento da pele e
tratamento de icterícia, dentre outros. Porém, caso não se tomem os devidos
cuidados quanto à dose de radiação solar recebida, diversos prejuízos poderão
ser causados ao organismo1.
O espectro
solar que atinge a superfície terrestre é formado predominantemente por
radiações ultravioleta (100–400 nm), visível (400–800 nm) e infravermelha
(acima de 800 nm). Nosso organismo percebe a presença destas radiações do
espectro solar de diferentes formas. A radiação infravermelha (IV) é percebida
sob a forma de calor, a radiação visível (Vis) como as diferentes cores
detectadas pelo sistema óptico e a radiação ultravioleta (UV), através de
reações fotoquímicas. Tais reações podem estimular a produção de melanina, cuja
manifestação é detectável sob a forma de bronzeamento da pele, ou pode levar
desde a produção de simples inflamações até graves queimaduras. Também há a
possibilidade de ocorrerem mutações genéticas e comportamentos anormais das
células, efeitos cuja frequência tem aumentado nos últimos anos. A necessidade
do uso de protetores solares, também denominados fotoprotetores, é uma
realidade indiscutível e, acompanhando esta tendência, o mercado oferece sua
resposta 2 , 3.
Em 2002, o
mercado de fotoprotetores faturou R$ 586,5 milhões e, em 2011, este valor foi de R$ 1.486,6 bilhão. Tais números
não somente revelam a crescente importância deste segmento, como também sugerem
o enorme potencial de crescimento para os próximos anos. Além do aspecto
mercadológico, o grande enfoque para este setor baseia-se na indiscutível real
necessidade da fotoproteção. Nesse sentido, e com o objetivo de oferecer
preparações com maior eficácia, ou seja, produtos com melhor ação protetora,
maior estabilidade química e mais acessíveis à população, o segmento tem
exigido dos formuladores grande aperfeiçoamento técnico e, dos fabricantes de
matéria-prima, pesquisa e desenvolvimento de novos filtros solares.
Além disto, é necessária uma melhor compreensão do comportamento físico-químico tanto das novas
quanto das tradicionais moléculas utilizadas como filtros solares 1.
No ano de 2002,
o curso de Biologia do Centro Universitário Padre Anchieta (UniAnchieta),
localizado na cidade de Jundiaí (SP), iniciou o projeto de extensão denominado
"Ciência na Praça", com objetivo de capacitar os acadêmicos dos
diferentes cursos da instituição ao planejamento, preparação, execução e
avaliação de trabalhos educativos na área das Ciências Naturais e da Saúde,
através de apresentações temáticas realizadas em praça pública, com o propósito
de divulgar o conhecimento científico para o público não-acadêmico. A
experiência de docentes e discentes com o referido projeto gerou a publicação
de um livro intitulado “Uma Praça, Uma Tenda”, no ano de 2008 4.
Os acadêmicos e
docentes do curso de Farmácia do UniAnchieta participam do Projeto “Ciência na
Praça” desde 2007. A inserção do curso visava ampliar a assistência à
população, principalmente em relação a medicamentos e cosméticos. Na edição do
projeto aqui enfocada, objetivou-se orientar a população quanto aos riscos
advindos da exposição solar excessiva e quanto ao uso racional dos protetores
solares.
Em 2011 e 2012, durante dois sábados pela manhã, um grupo de 10 acadêmicos dos últimos semestres do curso de Farmácia esteve na Praça Rui Barbosa, localizada na região central do município de Jundiaí (SP), abordando os transeuntes daquele local, para, sob supervisão docente, oferecer orientações sobre a saúde da pele no que tange à exposição desta à radiação solar. Os acadêmicos desenvolveram a atividade com o auxílio de folhetos informativos sobre "Câncer de Pele", doados pelo Conselho Regional de Farmácia (CRF/SP) [Figuras 1 e 2], e sobre "Protetores Solares", estes desenvolvidos pelo curso de Farmácia do UniAnchieta (Figura 3). Paralelamente, houve distribuição gratuita de amostras de protetores solares doadas por uma farmácia do município. A iniciativa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Padre Anchieta, sob o número 005/2011.
Figura 1: Folder fornecido pelo CRF/SP, contendo informações básicas sobre câncer de pele (frente).
Figura 2: Folder fornecido pelo CRF/SP, contendo informações básicas sobre câncer de pele (verso)
As transformações sociais e demográficas têm causado mudanças relevantes no estilo de vida e no surgimento de doenças crônico- degenerativas, como as neoplasias 5. O câncer de pele é um grave problema de saúde pública devido ao aumento em sua incidência, provocado principalmente pelas mudanças de hábito da população mundial com relação à exposição solar. No período de 1973 a 1994, a incidência do câncer de pele do tipo melanoma aumentou em 120,5% e a taxa de mortalidade, para 38,9%. Nos Estados Unidos, o risco de desenvolver melanoma foi de um para 1.500, em 1935; um para 250, em 1980, e um para 74, em 2000. No Brasil, são estimados milhares de casos novos de neoplasias todos os anos e acredita-se que 90% dos cânceres da pele não melanocíticos (carcinoma basocelular e carcinoma epidermoide) e 65% dos melanomas possam ser atribuídos à exposição solar 5. Nas últimas décadas, ampliou-se o conhecimento referente à etiologia do câncer de pele e identificou-se a radiação ultravioleta como um dos principais agentes envolvidos. A maior fonte natural de radiação ultravioleta é o Sol, ao qual a pele está em constante exposição, seja durante atividades recreativas, seja no trabalho. A prevenção do câncer de pele, no adolescente e no adulto jovem, é importante por ser nessa faixa etária que os indivíduos permanecem grande parte do tempo ao ar livre 6. A literatura aponta que o câncer da pele não melanocíticos ocorre com maior frequência em indivíduos que estão na quinta década de vida, aumentando a incidência com o avançar da idade. Porém, está crescendo o número de pacientes com idade inferior a 40 anos acometidos por neoplasias malignas da pele, provavelmente induzidas por uma combinação de fatores, entre os quais se destacam as influências ambientais relacionadas a atitudes e práticas de saúde e suscetibilidade genética. Indivíduos da cor branca são mais acometidos por câncer da pele, devido à maior sensibilidade fenotípica, estando dessa forma sujeitos a uma somatória de prejuízos decorrentes da radiação como queimadura, foto envelhecimento e lesões cutâneas, entre outros.5 Grandes esforços estão sendo empreendidos para melhorar o comportamento das crianças em relação à exposição solar, mas poucos programas de prevenção do câncer de pele são dirigidos aos adolescentes. Apesar dessas campanhas de prevenção darem ênfase aos riscos da exposição solar, os dados da literatura demonstram que 50% dos adolescentes bronzeiam-se intencionalmente e, quando ao sol, pouco aplicam o filtro solar ou usam chapéu e camisa, ficando assim expostos excessivamente à radiação durante o verão 6. Durante o período em que transcorreram as atividades do projeto, os acadêmicos do curso de Farmácia do UniAnchieta abordaram 350 transeuntes da Praça Rui Barbosa, tendo sido possível observar que um número significativo destes se expõe ao sol no período compreendido entre 10 horas e 16 horas, quando há a maior incidência dos raios solares sobre o espectro terrestre. De acordo com Popim et al., as pessoas de pele clara que vivem em locais de alta incidência de luz solar são as que apresentam maior risco. Considerando que mais da metade da população brasileira tem pele clara, se expõe muito ao sol e de forma descuidada, seja por trabalho ou por lazer, e que o país situa-se numa zona de alta incidência de raios ultravioleta, nada mais previsível do que a alta ocorrência de câncer de pele 7.
Em relação ao uso de protetores solares, a maioria dos transeuntes declarou utilizar, assim como praticar as outras medidas de fotoproteção, como o uso de chapéus. Os acadêmicos puderam reforçar a importância do uso racional dos protetores solares, sua adequada escolha de acordo com os diferentes tipos de pele e demonstrar sua correta aplicação por meio da amostra desses produtos. Os indivíduos abordados aceitaram as orientações com relação a fotoproteção, o que reforça a importância de ações relacionadas à conscientização e que melhoram o acesso da população a informações relacionadas à saúde. Os resultados obtidos com este projeto reforçam a tese de Castilho et al. sobre a crescente aceitação de práticas fotoprotetoras observada nas últimas décadas entre a população brasileira 8. Informações equivocadas sobre a formulação, segurança e eficácia dos fotoprotetores tópicos veiculadas na mídia, somadas aos custos do produto e baixa divulgação das demais medidas fotoprotetoras, podem dificultar melhor adesão a condutas saudáveis em fotoproteção. Além disto, falta consenso entre os especialistas sobre o impacto que as medidas gerais de fotoproteção tem sobre a vitamina D e o risco de fraturas e neoplasias, gerando diferentes orientações aos pacientes. Porém, o Consenso Brasileiro de Fotoproteção, recentemente lançado, torna claro e definido para os médicos e para a população o conjunto de medidas indicadas para adequada proteção da pele contra o sol 9. No Brasil, a divulgação de cuidados com a exposição solar geralmente ocorre durante o verão, o que pode induzir a proteção solar somente nessa época do ano 10. A divulgação mais intensa de pesquisas e campanhas relacionadas à fotoproteção podem modificar atitudes e comportamentos.
Esta iniciativa de extensão tem proporcionado aos acadêmicos do curso de Farmácia do UniAnchieta uma importante experiência na gestão de um projeto na área da saúde, uma vez que os coloca em contato com todas as fases envolvidas, incluindo-se aqui a prática da orientação racional para o uso correto de um dos mais consumidos produtos cosméticos do mercado brasileiro. O projeto continua a ser desenvolvido, buscando cada vez mais identificar os hábitos equivocados de foto exposição e fotoproteção da população de Jundiaí (SP) para, a partir dessas informações, oferecer orientações individuais e colaborar para a prevenção do câncer de pele. Diante disso, conclui-se que tal projeto possui um importante mecanismo retroalimentador, na medida em que, paralelamente à difusão de informações úteis à população, reúne dados capazes de subsidiar melhorias em edições futuras.
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